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quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

“Um Elefante Incomoda Muita Gente"

Por Rodrigo Toledo
    
     Hoje foi um dia como outro qualquer - às vezes, tenho a impressão de que os dias são sempre iguais. O sofá estava afastado da parede e, introvertidamente, deitei no chão entre o sofá e a parede. Fechei os olhos e... resolvi bater um papo com o meu passado. Foi uma conversa árida, sombria, sem sabor, sem cor, dolorida.

     Meu passado lançou-me na face coisas que fiz - das quais não me orgulho nem um pouco -, pessoas que decepcionei; gente que deixei de ajudar. Não consegui ser um bom filho para meus pais; destruí a paz de minha família. Fui um péssimo aluno no ensino fundamental... desvarios de um ser humano tentando ser normal!

      Devolvi a afronta. Coloquei o dedo na cara do "meu passado", apontando-lhe uma lista de fatos rudes que me marcaram e que me influenciam até hoje: poucas pessoas gostavam de mim por causa da minha aparência (oras, nunca fiz sucesso com as meninas); meus tios debochavam de mim; minha mãe me batia por não entender que a culpa de não conseguir aprender era da dislexia; estudei em escolas de nível educacional questionável; por culpa da anemia, mamãe me encheu de "suco" de fígado de boi, além das incontáveis mamadeiras com leite e farinha láctea (o que resultou num garoto BEM REDONDINHO).

      Ah, e falando nisso... que coisa, einh?! O garoto redondinho cresceu, comendo feito um demônio-da-tazmânia, tornando-se num adolescente obeso, retraído, cheio de complexos e irritado por não conseguir achar tamanho de calça suficientemente grande. Uma época de poucas amizades e muitas revoltas... muitas! Revoltado com a sociedade, com o governo, com a superficialidade das pessoas, com a falta de recursos, etc. Por vezes tinha vontade de morrer.

      Quando lembro desses tempos, quero tão somente me afastar de pessoas. Dá uma vontade de fazer cara-feia, cruzar o braços e gritar "Afastem-se, tenho lepra!"

        É, eu sei! Solidão nunca resolveu nada. Racionalmente tento evitá-la. Solidão não passa de uma armadilha funda, escura e fria. Mas, ao mesmo tempo, é tão difícil pra mim entender os humanos, criaturas nascidas sem nenhuma glória, em meio a fezes, sangue e dores, num pedaço de pano que chamamos por lençol.

        Oh, quão miserável e hipócrita eu sou! Tão cheio de defeitos quanto qualquer outro...

      Não quero mais conversar com meu passado. Saí daquele diálogo mancando e sangrando. Abri meus olhos, a ainda estava lá, atrás do sofá, ridiculamente deitado no chão feito criança tristonha.

     Ainda sou o mesmo. Cheio de defeitos, meio-revoltado, obeso, complexado e grisalhamente um pouco mais velho. Minha aparência continua não agradando a maioria. Para mim é comum observar as pessoas ocupando todos os lugares do ônibus, menos aquele que está ao meu lado. Afinal, "um elefante incomoda muita gente", não é mesmo?

       Quem sabe eu emagreça pra me vingar do "meu passado". Talvez eu decepcione menos, e ajude mais. Isso sim é um bom pensamento! Essa é a parte da história que me arranca sorrisos.

    "Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus.

     Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados.

     Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra.

     Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos.

     Bem aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia.

     Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus.

     Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus."

     Sermão da Montanha, por Jesus Cristo. Mateus, cap. 5

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