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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

INVERSÃO DE VALORES

Por: Diogo Henrique de Sá

"E ordenou-lhe que a ninguém o dissesse. " (Lc 5,14 )


                   Como as coisas mudaram, desde que Jesus andou entre nós a 2 milênios atrás, antes o curandeirismo[1] era coisa de mágico e eram praticados em nome dos deuses, hoje qualquer charlatão faz “milagres” em nome de Jesus, e muitos de nós, cristãos[2], batemos palmas em êxtase.
                  Não foi só isso que mudou, Jesus operou e opera milagres legítimos [3], porém quero me deter somente no período que nosso Senhor esteve aqui, como homem, empoeirando seus pés. Durante seu ministério terreno Jesus fez grandes sinais, no entanto evitou ao máximo uma publicidade desnecessária com relação aos milagres por Ele ministrados. Jesus não queria que sua imagem ficasse associada à de um milagreiro qualquer, na verdade se observarmos direito o Novo Testamento, veremos que Jesus só fazia o que fazia, porque se movia intimamente de compaixão para com as pessoas a sua volta, ou seja, os milagres realizados por Jesus eram reflexos do seu amor por nós. Jesus nunca cobrou nada por esses milagres, nem mesmo queria mais atenção ou fama pela realização dos mesmos. A intenção de Jesus era sempre disseminar a Mensagem do Reino, pois “com seu conhecimento meu servo justo justificará a muitos, e levará as iniqüidades deles” (Is 53.11)
              Hoje, quanta mudança! Os milagreiros da última hora fazem de tudo por cinco minutos de fama. Com a maior “cara lavada” colocam suas fotos em banners, em folhetos, em cartazes, dentro dos templos enfim em toda parte. O incrível é que fazem tudo oposto do que Cristo fazia. Jesus operava milagres mas não queria ficar famoso, antes sua intenção era espalhar as boas notícias de salvação e no processo glorificar a Deus, hoje, veja o disparate, estes curandeiros querem ser conhecidos pelos seus supostos milagres, não pregam o Evangelho verdadeiro e glorificam a si mesmos.
              Percebeu a mudança? Brusca né? Mas por que isso ocorre com tanta freqüência nos dias de hoje?
             Bom, antes de respondermos a essa questão precisamos lembrar que essa prática não é nova não, é que hoje é feita em grande escala e em nome de Jesus, mas já temos relatos disso ocorrendo no Novo Testamento. Lucas afirma em Atos 8.9-24 que um certo mágico chamado Simão, quando viu a virtude do Espírito Santo na vida dos apóstolos, quis comprá-la a todo custo.
              Mas... Voltando a questão... O problema, na verdade, é que o desejo pela popularidade é, por mais estranho que pareça (pois não consigo rastrear o porquê disso), inerente ao próprio homem. Existe uma gana no inconsciente humano que o faz desejar ser melhor que os outros, e a fama cria a ilusão de que isso é possível. Desde os tempos mais remotos o ser humano almeja o prestígio. Moisés nos conta no livro do Gênesis que um certo homem chamado Ninrode [4], quando edificou a torre que depois se chamou Babel, disse: “Eia, edifiquemos nós uma cidade e uma torre cujo cume toque nos céus, e façamo-nos um nome...”. Perceba que o desejo era “fazer um nome”, ou seja “seremos famosos”. A questão desse desejo pela notoriedade é tão complexa que Locke [5] vai falar um pouco dela quando trata da questão do “super homem”.
               Agora, voltando ao Gênesis, lembre que o primeiro pecado praticado pelo homem foi desobedecer pelo simples prazer de desobedecer, pois se lermos atentamente o capítulo 3 deste livro vemos que o diálogo entre Eva e a serpente nos revela algumas pistas sobre isso:


• A conversa parece se passar em frente à árvore do fruto proibido;


• Eva já sabia também onde ficava a árvore, ela diz que: “Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis para que não morrais” (Gen.3.3). Sei que não parece haver nada demais nesta afirmação, mas se observarmos bem, Deus não havia dito que a árvore estava no meio do jardim [6],


• O Fruto também, segundo Eva, era de agradável visão – era bonito – por isso a Igreja Católica chegou a adotar como dogma que o fruto era a maça. Eva queria comer o fruto até pelo fato de ser proibido (é aquela história que a fruta da árvore do vizinho sempre é mais gostosa).


• Mas nada falou mais alto do que o desejo de ser deus, a cartada final da serpente foi: “Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal.” (Gen. 3.5). O pecado aí foi o mesmo que Satanás cometeu: Querer ser Deus.

                  Por isso, ao invés de procurarem, como aconselha a Palavra de Deus, glorificarem a Jesus em seus membros, e procurarem o anonimato já que tudo vem dele, estes procuraram usar o nome de Jesus somente para dar estrutura para sua fama, usando-se do nome Cristo, sem ter nenhum compromisso com Ele, para se auto promover. Enquanto o Capitão da nossa Fé nunca procurou os holofotes, nós pedimos para, se possível, acender mais.
                 Os milagres eram realizados por Jesus por compaixão, hoje são operados por dinheiro e Status. Quanta mudança. Quanta mudança. Mas qual exemplo é o verdadeiro? O de Jesus ou o dos Milagreiros modernos? Acho que não precisa responder.
                  Sabe, pra ser sincero, essa atitude prepotente de se auto glorificar, de colocar sua foto em vários lugares me enoja, isso porque eu reconheço a imensa e maravilhosa Graça de Cristo sobre a minha vida, eu, um miserável pecador, fui alcançado pelo seu imensurável Favor. Como posso passar um dia sem que eu seja agradecido e exalte o nome Dele? Ele precisa ser exaltado por tudo o que Ele é para mim. Faço isso por gratidão, sem que consiga realmente adorá-lo em toda a sua magnitude, mas prossigo a adorá-lo como posso. Reconheço que Deus não precisa de nada que eu tenho, ele disse: “meu são todos os carneiros nestas montanhas...”[7] , “se eu tivesse fome te pediria algo de comer, e se tivesse sede te pedira algo para beber”[8] e ainda: “Nem todo o Líbano basta para o fogo, nem os seus animais bastam para holocaustos.”(Is. 40.16). Apesar disso, apesar de saber que não tenho como acrescentar glória aquele que é Todo Glorioso, prossigo a exaltá-lo, mesmo sendo vil, como sou, prossigo deixando ele crescer e lutando para que eu diminua sempre.
                  Reconheço que o Orgulho é terrível, ele nos corroe, se aproxima de nós sem que percebamos, e parecendo ser algo tão inofensivo, rapidamente nos domina. Já caí neste engodo e reconheço sou orgulhoso, então, como um alcoólatra que nunca está curado mas consegue se controlar, eu me achego até a Cruz por que lá eu vejo estampado em Jesus todas as minhas vergonhas, aos pés da Cruz vejo os meus pecados e como fui um inútil para pagar até mesmo a minha dívida, e como sou salvo pelos méritos de outro, e não pelos meus, e então através da leitura da Palavra de Deus (sobretudo do Novo Testamento, que hoje em dia anda tanto desprezado) sou grato e todo o meu orgulho se vai, pois a Nova Aliança me propõe Abandonar tudo o que eu acredito ser (o Bom, o Imprescindível), para reconhecer que Jesus e deve ser Exaltado pois Ele é o Tudo em Todos.
                  Estes homens e mulheres “famosos” que estão dentro das instituições eclesiásticas, mas querem Fama e reconhecimento, devem voltar-se para algo que eles tem desprezado, que é a Santa Palavra de Deus, o quanto antes, pois se não o que lhes aguarda é uma eternidade afastada irremediavelmente do Salvador.
               A Jesus Cristo Seja a Glória. Para Sempre


Nota:
1. É lógico que esse curandeirismo nada tem a ver com os verdadeiros milagres operados por Deus através dos Profetas e Apóstolos, nem dos operados por Jesus Cristo.
2. Na verdade estes usurpam pra si um título que não lhes cabe.
3. Na verdade, com relação a milagres, precisamos entender que, aquilo que consideramos ser um prodígio extraordinário, pra Deus não é nada demais.
4. Gênesis 10,8-10 .
                 Pronto, chegamos ao “X” da questão, esta inversão de valores está ocorrendo porque estamos deixando extravasar um desejo incontrolável de usurparmos a glória que é de Deus; um desejo incontrolável de tentar tomar o seu lugar, sobretudo, nos corações dos outros homens; um desejo, disfarçado, mas incontrolável de dizer: “Subirei sobre as alturas das nuvens, e serei semelhante ao Altíssimo” (Is.14.14).

5. LOCKE , John ( 1632-1704) . Ensaio Acerca do Entendimento Humano ; tradução Anoar Aiex e Jacy Monteiro. São Paulo: Abril Cultural, 1978 (Coleção Os Pensadores).


6. Genesis 2.17. “Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás.”
7. Parafraseando o Salmo 50,10-13 .

8. Ibidem.

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